quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Das andanças pelas terras mineiras - Belo Vale

Em novembro de 2009, tive a oportunidade de visitar a cidade de Belo Vale. Trata-se de um pequeno município de Minas Gerais, localizado no quadrilátero ferrífero do estado, que possui referências materiais de grande importância histórica, patrimonial e turística: o Museu do Escravo, único dedicado ao tema no país; a Fazenda Boa Esperança, que pertenceu ao Barão de Paraopeba; a Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte, fundada em 1760 pela bandeira de Gonçalo Alvares e Paiva Lopes, dentre outros.

Eu queria conhecer o distrito de Boa Morte e a Cachoeira da Boa Esperança, claro! Chegando ao distrito, fiquei encantada com a estrutura do lugar. Observei atenta a disposição das casas em torno da igreja, lembrando o quadrado jesuítico; a belíssima Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte, com um sino imponente no adro (!) e o vasto terreno gramado ao centro.
Como bom mineiro e conhecedor dos moradores, meu cicerone, Eric, me levou ao encontro de Dona Jordelina, que estava em frente à sua casa, em companhia de sua filha. Dona Jordalina nos recebeu com alegria e, aos poucos, foi nos contando de sua história.
Como ela não foi registrada pelos pais à época de seu nascimento, devido à distância do distrito até o cartório mais próximo, não se pode dizer com precisão a sua idade, sendo atribuída em sua certidão de nascimento a casa dos oitenta anos. Alfabetizanda, Dona Jordelina visita a escola todas as tardes e, para além dessa rotina, ela mantém um belo altar na sala de casa, onde reúne, ao lado de imagens de santos católicos, alguns objetos de afeto, como colares, fotografias de familiares, ervas, calendários, brinquedos etc.
Dona Jordalina nos presenteou com o relato do saber de seu pai, afamado benzedor do distrito. Embora ela não se diga herdeira do posto de benzedeira, após o falecimento do pai, a fala de Dona Jordelina a revela detentora de vasto saber sobre as plantas, somado ao poder da fé e do sorriso que conserva sempre ao rosto.
Mas a grande lição que guardo dessa visita ainda estava por vir. Depois de nos falar sobre plantas, vivências, rotina, Dona Jordelina nos fez atentar para uma questão que antecede a sua condição de guardiã de patrimônio imaterial, quando nos disse: “vem muita gente aqui, querendo saber do passado, ver o telhado antigo, mas o que eu quero saber é da mesada, quando vai chegar a merenda”. Ficamos estáticos diante da constatação de que, para salvaguardar o patrimônio imaterial, era necessário dar condições para que as pessoas tivessem dignidade no cotidiano, entendendo que, para se receber a “dádiva” de vivenciar o patrimônio, é fundamental pensar as condições para que as pessoas possam exercer sua cidadania.
Obrigada pela lição, querida Mestra!
Seguimos para a cachoeira da Boa Esperança. Água geladinha para espantar a febre de quase 39 graus que eu sentia. Delícia de lugar!

Não podia voltar sem visitar a imponente Fazenda do Barão de Paraopeba. Lá chegando, o responsável pela guarda do patrimônio nos proibiu de imediato em fazer fotos. Nada que um bom papo mineiro não resolva: a proibição aconteceu porque o IEPHA descobriu que um grupo de pessoas vinha gravando filmes pornô no local e divulgando tudo na internet. Com tanta coisa curiosa pra se explorar naquele casarão, ainda tem gente que prefere perder tempo... Visitamos os vinte e cinco (ou quatro?) quartos da casa, nos refrescamos à sombra das sapucaeiras do terreiro e ouvimos o guardião nos contar da sua tentativa de pacto com o plano espiritual para encontrar o tesouro do barão:
 - Eu combinei com os espíritos que, se eles me mostrassem onde ficou escondido o tesouro do Barão, eu mandaria rezar três missas para eles. Nada feito... Até hoje eu procuro e não acho (risos).


Um comentário:

  1. Conheci uma Dona Benedita em Santo Antonio do Rio Preto que "dava umas parecenças" com essa Dona Jordelina. Patrimônio de Minas, essa mulheres.
    Bela descrição turistica Aline
    Abraços
    Norma

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