Certa
vez, fiz uma viagem que eu desejava há muuuito tempo. Mas trabalhei sete vezes
mais do que o planejado. Como sempre, consegui passear, mas ficou aquele
gostinho de fazer uma viagem inteira só a passeio, já que eu estava há muitos
anos sem férias de verdade. Pensei: posso voltar a Rio Branco e esticar até
Machu Picchu. Depois pensei um pouco mais... Eu queria ir à Bolívia também.
Então eu vi as fotos da filha de uma amiga mochilando pela Europa. E ouvi
histórias de mochilagem com a super amiga com quem tenho a honra de dividir um
apê. Falei com vó e, com o surpreendente apoio e respeito dela, comprei uma passagem para La Paz. E tinha
uma conexão em Santiago. Melhor impossível! Ao menos até aqui.
Eu acho que nunca entrei na sala de aula tão radiante
na vida como na manhã do dia seguinte. Eu me sentia a pessoa mais corajosa e
cheia de energia do mundo. E a mais indecisa também, afinal, valia a pena
conhecer o Chile, ainda mais com o tanto de amigos que eu tenho por lá... Como boa
geminiana, a dúvida me corroeu até o último minuto. Eu achava que, aos 32 anos,
eu não teria forças para curtir uma viagem tão longa de busão. Mas se não
fosse aos 32, seria quando mesmo? Como eu dizia, a dúvida me corroeu até o
último minuto, mesmo, pra valer. Acordei em Santiago e olhei para o ticket.
Olhei para o relógio, olhei pela janela. Então decidi ficar lá. Era pra ser só 13 horas, uma noite e uma manhã, o tempo de uma conexão, mas eu fiquei uma semana inteira na cidade mais romântica, ecológica e saudável que conheço. Foi muito difícil desapegar de Santiago. Prometo contar mais sobre isso em outro post. Aqui vão só as primeiras emoções de viajar só.
Para
começo de conversa, eu não acreditava que eu fosse capaz de me divertir e “administrar”
uma viagem tão longa, principalmente porque eu tenho esses revezes típicos de
uma boa vata. Eu não queria reservar hospedagem antes de partir porque eu não
tinha a menor ideia de quanto tempo eu ia querer passar em cada cidade. Eu só
sabia que não queria ficar mais do que doze horas em um ônibus. Então eu
escolhi, minimamente, as cidades que queria conhecer. Nada de metrópole, mas também
nada que não tivesse história para contar. Porque muito mais vive o homem de
suas histórias do que de pão ou coisa do tipo.
Era
verão, mas em cidades de geografia montanhosa eu não tinha garantias de clima
quente ou frio. Levei as minhas blusas mais velhas, minha calça jeans mais
confortável, uma calça de esporte, daquelas folgadinhas, uns shortinhos e algumas novidades (leves, compactas, novas e
fáceis de secar) para o frio: uma calça térmica que funciona como legging, um
fleece, uma blusa de manga longa, uma segunda pele, ou seja, duas mudas de
roupa apenas. Quem leva muita coisa não traz nada, porque não há coluna sedentária
que aguente!
Pelo
caminho, muitas pessoas perguntavam “Estás solita?”, “Por qué estás solita?”, “No
tienes miedo de viajar solita?”, “Para que te vas a viajar sola, para se perder
en el mundo?”. Eu sempre respondia com toda a serenidade do mundo: viajo sola
porque soy solita, pero no me pierdo, tiengo Diós a guiarme... tiengo más miedo
que quedarme solita em mi casa em mis vacaciones... Não sei se pareci
grosseira, mas isso saía de meu coração, do meio das verdades mais profundas e
preciosas que carrego comigo.
E, em
verdade, foi até um pouco difícil ficar sozinha nessa viagem. Há muitas pessoas
nessa rota. A maioria prefere descer a América do Sul, mas sempre há algumas a
subir. E quer saber, não importa até onde a rota delas coincide com a que
traçamos. Qualquer bom encontro já é um alimento para alma. Mas não se vive
bons encontros do nada, em qualquer esquina ou mesa de restaurante de
rodoviária. É preciso vibrar na nossa frequência mais sincera e feliz para
atrair as pessoas que podem nos fazer crescer. Me abri para fazer amigos. Sentei
em mesa de quem eu tinha acabado de ver na vida. Proseei com gente que estava
ao meu lado no ônibus por horas seguidas: adultos, crianças, brasileiros até! Mesmo
com toda timidez e dificuldade de compartilhar com muitas pessoas ao mesmo
tempo, consegui conhecer muitas pessoas. Consegui fazer amigos de bom coração a
quem jamais esquecerei. Aprendi coisas que nem imaginava estar na agenda das
mudanças necessárias no meu jeito de sentir e (re)agir.
Percorri
cerca de 17.900 km. Se bobear, isso é tanto quanto aquilo que alguns de meus
tios caminhoneiros já percorreram na vida! E não, não é preciso coragem para essa parte operacional. Basta comprar um bilhete, entrar no ônibus e você vai acordar em outra cidade. O que carece de boa vontade, pertinácia e cautela é a parte que está além da viagem pelo mundo de
pedra, água, ar e vida, afinal, também se viaja no mundo interior. A vida das pessoas
que ficam e que passam modifica a nossa vida, sobretudo porque nos faz ter mais
humildade, mais capacidade de resolver problemas, mais flexibilidade de visão
para inventar e experimentar novas atitudes. Vale destacar isso com todas as
cores e post-its do mundo: fora de casa não vale repetir as atitudes que se
enraizaram na tal zona de conforto! Fora de casa tem que ser criativo, tem que
se permitir usar o tempo de outra maneira – e falamos de outro tempo, o tempo
das férias, que é kairós, é lentidão e reflexão; aqui temos tempo para nós e
somos tempo para o outro. Ouvir a experiências do outro e beber da fonte de
novas ideias que atravessam continentes, oceanos, é um exercício de força e
coragem. Sim, é preciso coragem para torcer o nariz para o conforto nosso de
cada dia. Fiquei sem banho algumas vezes, mas e daí, se eu vi, ouvi e senti
tantas coisas que não me sensibilizariam se eu fizesse tudo sempre igual, tudo
sempre certinho?
Que experiência sensacional Aline...uma viagem assim traz vida, alegria! Por ser criada por você e vivida de acordo ao que surgia trouxe, certamente, oportunidades e sentimentos incríveis. Bom demais! Adorei seu texto.
ResponderExcluirUau!!!
ResponderExcluirEu acompanhei em tempo real via facebook, e estou ansiosa por todos os relatos ao vivo e a cores (HOJE!!!) e escritos (para voltar sempre).
Você é uma inspiração, sempre!!!
Bjoooo
Eu fico profundamente feliz com suas palavras, meninas! Vamos nos inspirando e compartilhando nossas vivências sempre!
ResponderExcluirEita, Baia corajosa!!!
ResponderExcluirTem muito a transmitir as pessoas as experiencias!
Parabéns!