quinta-feira, 14 de abril de 2011

Ratinho, ratão!

Faz uns dias meu primo de oito anos apareceu com um dentinho na mão e um sorriso baguelo. Todo animado, ele veio mostrar à Vó a parte de seu corpo que agora estava “liberta” dele próprio. E veio cheio de planos a respeito do futuro daquele pedaço de infância exibido como troféu - não se sabe bem de que tipo de vitória, mas uma vitória certamente.
- Vou guardar para mostrar ao dentista!
E Vó retrucava:
- joga fora, menino feio! Coisa nojenta!
E aí lembrei que tínhamos uma brincadeira com os dentes caídos – ou arrancados, como eram os meus: a costureira da rua onde vivi minha infância envolvia o dente “mole” com vários laços de linha e o arrancava com um puxão só.  Naqueles idos, eu fui orientada pela prima um pouco mais velha, melhor dizendo, mais experiente, a atirar aquele meu exemplar rejeitado de cálcio ao telhado de uma casa, ao mesmo tempo em que recitava uma trovinha. Daria sorte! Para mim e para o dente que já se mostrava em crescimento na gengiva.
- Jogue em um telhado! Assim você se livra da parte nojenta e ganha saúde para o dente novo!
Foi quando ela se lembrou dessa crendice e reforçou a importância de manter a tradição.
- Explica pra ele, Aline, como são os dizeres pra o dente novo ser bom!!!
Tirei as vistas do PC e chamei o magricelinho ao meu lado.
- Mostra aqui! Hum... Você vai procurar uma casa com telhado, não serve laje. Daí você olha para o alto e diz “ratinho, ratão, toma esse dentre podre e me dá meu dente são”.
Ele riu e saiu disparado, casa a fora.
Foi quando me lembrei de um professor da Universidade de Alcalá, na Espanha, que visitou a Uesc em 2006 durante um seminário. O professor José Manuel Pedrosa (ou Pepe, como uma amiga preferiu chamá-lo), pesquisa folclore e literatura, sempre de modo etnográfico.  Naquele ano, ele lançava mais um título entre suas incontáveis publicações sobre o assunto: “Ratito, ratón”. O danado reuniu nesse livro mais de duzentas variações dessa parlenda, só em seu país!!!
Imagine quantas hão de existir por aqui?

Um comentário:

  1. No meu caso dizia - Mourão, Mourão, toma teu dente podre e me dá o meu são-
    Muito linda a reflexão.
    Abraços

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