Deixa eu contar pra vocês uma experiência sem precedentes
que vivi nesse fim de semana de 15 e 16 de outubro. Mas se prepare pra um texto
que me expõe um pouco mais, tá? É que não posso falar sobre a Contelação
familiar sem explicar o tamanho do problema e do benefício.
A primeira vez que ouvi falar em Constelação familiar, eu
nem dei a mínima. Foi numa seção de acupuntura e o profissional desabafou os
porquês de proibir essa experiência no espaço que ele e a esposa criaram. Como
ele só relatou os riscos, então eu sequer registrei a possibilidade de algum
dia procurar essa terapia. Mas não demorou pra outra pessoa em quem eu super
confio tocar nesse assunto. Ela me disse: “É maravilhoso. Você conta o
acontecimento que te marcou, voluntários representam o fato e aí... vai constelando...
Todos os envolvidos no trauma vão sentir os efeitos, mesmo à distância, mesmo
sem saber”. Ouvi atenta, curiosa até, mas confesso que ainda não conseguia
botar fé naquilo. Então eu iria contar sobre os ocorridos dolorosos de família
pra um grupo e pessoas aleatórias fariam um trabalho cênico e aí meus traumas
se dissolveriam no tempo? Foi difícil de me imaginar nesse trabalho.
Mas eu não me esqueci daquele conselho. Na segunda
oportunidade que tive de visitar São Paulo, coloquei essa busca na lista. E foi
de surpresa que essa viagem aconteceu: eu não poderia dar aulas na pós da Ufob
por conta do pé convalescente, então poderia fazer algo mais suave durante as semanas
seguintes, que seriam de recesso acadêmico. Escolhi participar de um curso de
efeitos visuais com um grande profissional de Hollywood, à noite; os dias
seriam dedicados às correções da tese e à fisioterapia. Me restava um fim de
semana livre depois do curso, pois as passagens aéreas ficam mais em conta nas
segundas-feiras. E nesse fim de semana haveria um workshop de Constelação
familiar. Tudo conspirou pra dar certo. Quase tudo. Demorei pra confirmar,
afinal essas experiências muito profundas assustam um pouco. O jeito foi entrar
na lista de espera. E na véspera, uma pessoa desistiu. Aí, sim, foi conspiração
astral!
Cheguei ao Instituto Mario Koziner em cima da hora e logo
que entrei no salão meu coração disparou, me emocionei e senti muita vontade de
chorar. Assim mesmo, do nada, eu queria chorar. Só passou quando Mário entrou
no salão e se posicionou na roda. Ele é
argentino, médico psiquiatra. Quando todos silenciaram, ele apresentou o
trabalho: todos somos filhos, então estamos integrados a um sistema. Podemos
observar esse sistema como se fosse um tecido. Na trama do tecido, os fios
podem estar em harmonia, mas também podem sofrer choques que levam a
emaranhados, resultando em desarmonia. O trabalho de Constelação familiar,
criado pelo alemão Bert Hellinger, parte do princípio de que todas as relações
são amor em movimento, tudo que flui é amor. Esse amor pode levar à felicidade,
mas também pode levar à dor. Corrigir o fluxo que, por conta de algum
emaranhado, levou a pessoa à dor é uma das potências da Constelação familiar. Então
tudo depende de saber por onde o amor flui e assim buscar a harmonia.
Mario também explicou que a Constelação familiar trabalha em
três ordens. Existe a ordem do pertencimento,
que reza que todos pertencemos a algum sistema. Se há alguma exclusão, por
exemplo, o sistema se mostra em desarmonia. É necessário incluir o que está de
fora para que o amor possa fluir bem. Existe a ordem da hierarquia, na qual cada membro do sistema tem sua própria carga.
Se algum membro transmite sua carga para outro, ele se enfraquece e o outro
padece. Se essa carga é devolvida à origem, o membro se fortalece e o outro
recebe a força que precisa para se alinhar ao sistema e seguir rumo às suas
buscas na vida. Esta é também a terceira ordem, a ordem do dar e receber. Nas famílias, tem que haver circularidade de
energias e isso se refere à carga de cada um. É necessário devolver a carga e
receber a força, deixar com o outro o que é do outro e seguirmos apenas com o
que nos pertence, pois é assim que superamos o emaranhado e seguirmos para o
que desejamos. Ter a força familiar é
estar livre.
Então eu fiquei atenta, copiei tudinho e pedi muito a Deus
que me permitisse encontrar redenção.
Eu nunca tinha assistido a nada tão emocionante na minha
vida. A pessoa relata sucintamente o que a aflige e alguns voluntários entram
em conexão com o constelador (o paciente, digamos assim). As energias guiam os
representantes e o sistema se abre, mostra a raiz do problema, ajuda a o
constelador a compreender cada parte envolvida e pode até apresentar uma imagem
com a solução do problema. E tem perdão, tem reconciliação, tem paz e leveza.
Me identifiquei com muitos casos anteriores ao meu e já sentia que alguns nós
internos, nós emocionais, se desfaziam ali mesmo. Sentia muita emoção. E muita
fome. Esse negócio de passar da dor à paz dá muita fome. Me explicaram que é
porque consome muita energia. Mas o lanche garantia a reposição J
Ao final da tarde do primeiro dia, chegou a minha vez de
constelar. Fui certeira ao ponto. Quero constelar o problema do abandono na
minha vida. O abandono paterno, materno, os muitos abandonos afetivos e o
abandono reverso (eu desistia dos projetos, dos empregos, das amizades e das
cidades antes que elas desistissem de mim). Quero conseguir amar as pessoas que
não conseguiram participar de minha caminhada e deixar de cultivar espaços para
o abandono na minha vida. Enfim, meu propósito era me sentir, afinal, integrada
a um sistema. Para isso, eu precisava romper as barreiras da superficialidade nas
relações e encontrar recursos para construir relações profundas, duradouras.
Era só isso que eu queria.
Mas isso é muita coisa pra uma constelação só. Tive que me
contentar com o recorte da questão materna. E olhe que foi coisa, viu? Eu não
podia imaginar que a raiz desse problema estaria em incontáveis gerações
anteriores de mulheres da minha família. Todas, em alguma medida, de maneiras
diferentes, foram impedidas de amar suas descendentes. A explicação é que, em
algum momento, duas mulheres da família entraram em conflito e a carga dessa
rejeição foi transmitida para as mulheres que vieram depois. De maneira
inconsciente, esse peso se manifestava: uma filha sentia medo da mãe, a outra
sentia indiferença, a outra sentia rejeição. Quando o arquétipo da origem do
problema se reconciliou e a carga negativa foi devolvida à fonte do problema,
todas as demais gerações puderam se libertar. Fui considerada como uma pessoa
de coragem por levar paz e força a todas as minhas ancestrais. Com a força
delas, pude caminhar para a profundidade, me sentindo, nas palavras de meu
representante, “pronta para a vida”.
Eu não tenho palavras para descrever o quanto me emocionei
com essa experiência. Eu saí do instituto me sentindo como alguém que renasceu
para o mundo. Fui para o centro da cidade e, para minha enorme surpresa, me
peguei caminhando pela Avenida Paulista de um jeito diferente. Tinha plena
consciência de meus pés, de meu quadril, tinha os ombros leves e olhava nos olhos
das outras pessoas. Eu não tinha na memória o registro de como era andar de
cabeça erguida. E te digo que isso é efeito do grande orgulho que agora sinto de
minhas antepassadas. Nosso clã é bonito e está em harmonia.
Acredito que até o problema de menopausa precoce possa ser
revertido. Não rejeitamos mais nossa descendência. Temos força e amor para
transmitir aos filhos que virão. E estou, sim, preparada para viver em família:
a que já tenho e a que desejo construir.
E se existe um conselho que eu sempre vou oferecer a quem me
confiar conflitos familiares é que busque pela experiência da Constelação
familiar. Porque para mim, foi como um divisor de tempos: a.C. e d.C., ou seja,
antes da Constelação e depois da Constelação.
<3
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