Certa vez, consultei ao I Ching sobre como proceder diante de uma perda. Sabiamente, respondeu-me o oráculo chinês: “a roda da vida gira e tudo se transforma”.
Arrisco-me a destacar, entre as poucas certezas capazes de silenciar a um ser vivente, a finitude dos bens materiais, as partidas das pessoas queridas e a morte. Ao mesmo tempo, deparo-me, quase ciclicamente, com a amplitude desses conflitos.
A vida material é uma parte do processo de aperfeiçoamento do espírito. Apresenta desafios, possibilidades, permite inovações ou destruições, conforto ou sublimação.
A vida social e afetiva é a outra parte. Estimula, acelera ou consolida a educação dos sentimentos, da conduta, da convivência.Também pode limitar a tudo isso.
Sim, a lógica é dicotômica. Assim como morte e vida, sansara e nirvana.
Se a perda de algo ou de alguém é capaz de impactar-me, é porque houve para com o bem ou a pessoa um vínculo gerador de afeto que considero salutar, inclusive vital. Por outro viés, houve também um apego, que gerou um condicionamento, uma dependência.
Daí a roda da vida gira, simples assim.
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Como sujeito inacabado, marcado pela incompletude pós-moderna, permito-me registrar à cabeceira da cama duas novas assertivas (ainda que momentâneas):
1 - Que a matéria - com toda a sua carga de necessidade e conforto - não subordine uma existência, limitando as buscas do sujeito a patrimônios tangíveis, a poderes ou prazeres de posse ou domínio.
2 - Que os afetos, fonte e razão de conquistas materiais e morais, não enraízem os pés de um sujeito a restritos grãos de terra, a estreitos horizontes sociais.
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Das experiências bem sucedidas de desapego, listo algumas simples e eficazes:
não sentar na mesma cadeira de uma sala de aula;
não deixar de mudar de equipe de trabalho ou estudos;
não deixar de conversar ao menos uma vez com cada colega;
doar uma roupa de que se goste;
aceitar que uma amiga faça o seu prato ao menos uma vez;
aceitar que uma amiga goste de um desafeto seu;
aceitar que o namorado selecione por si o seu círculo de amizades;
aceitar a partida e a chegada repentinas de mãe, pai, irmãos. Inclusive a permanência deles perto ou longe;
cozinhar para mais de uma pessoa, ainda que não se esteja à espera de alguém;
hospedar e ser hóspede;
ouvir.
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