Não faz muito tempo, precisei de ajuda para cuidar de alguns
– em verdade muitos – nódulos de tensão na região do pescoço e ombros. Não
raro, ouvia que isso era reflexo da tentativa de “carregar o mundo nas costas”.
Eu, cabeça dura que sou, me opunha, julgando que minha vida era até bem
tranquila.
Entretanto, faz cinco meses que me encontro longe da
quiropraxia combinada à massoterapia e muito, mas muito perto da filosofia. Aos
poucos, fui compreendendo que o peso que eu carregava de fato era intenso, pois
habitava os porões de uma formação rígida, auto exigente, pouco questionadora.
Foi o start para uma série de "booms estéticos" sobre a leveza, todos vivenciados
no cotidiano, ao inesperado. Imagino que seja delicado compartilhá-los, mas eu
gostaria de colocá-los, minimamente, apenas para fazer pensar.
O primeiro deles está ainda relacionado aos tais nódulos de
tensão. Era preciso fortalecer a musculatura e eu tentei fazê-lo pela arte.
Ainda que sem muita noção dos riscos, decidi conhecer o tecido acrobático. A
professora parecia levitar no alto do tecido, tamanho conforto emotivo
transparecia a cada movimento. Aquela leveza, no entanto, só seria alcançada
com muito esforço físico e coragem, ou seja, era necessário ter força,
equilíbrio, segurança, impermeabilidade ao medo de altura e, principalmente, de
perder o solo firme sob os pés, de voar...
Certo estava Ítalo Calvino quando afirmava que a leveza
exige uma luta paciente contra nós mesmos e contra a linguagem estabelecida, ou
seja, exige uma resistência à zona de conforto, um esforço em tornar-se criador
(de si e do simbólico) e não somente consumidor do que pronto está pelo mundo. Exige
ainda uma atitude peregrina do olhar, não se deixando prender pelo desânimo,
pela leitura única (certa) sobre a realidade, mas deslocando-se, visitando
outras leituras possíveis sobre as palavras e as coisas e as pessoas. Calvino
até cita Paul Valéry: “É preciso ser leve como o pássaro, e não como a pluma”,
pois o voo tem direção, é resultado de uma escolha planejada, é autônomo e
seguro.
O peso, assim, não deve ser evitado. Responsabilidade é uma
virtude e não se trata de abandoná-la, mas de desenvolvê-la com alegria e
segurança; vínculos são necessários, mas devem promover as pessoas, não aprisioná-las
ou paralisá-las. Cada encontro é um presente, cada aprendizado é um legado e
esse patrimônio somente se sustenta com o movimento, com mais trocas, com o
doar-se e o abrir-se para receber o novo.
Foram essas as lições que aprendi no melhor agosto de minha
vida. Vale contar ainda que elas foram reforçadas com a mesa de título Infância
e juventude no IX Enecult, em setembro, na cidade de Salvador. Educadores
artistas de vários pontos do mundo se reuniram para testemunhar a importância
desse deslocamento e resistência ao peso do instituído, destacando que a leveza
é parte do e é o próprio método do processo educativo.
Assim ensinou Pinduca: “os muros das escolas não são feitos
de concreto, mas de ideias, que são o material mais resistente que existe. Ele
só pode ser vencido pela busca pela beleza”.
E completou Lydia Hortélio: quando as crianças sentiram que
a atividade estava para acabar, pedi que limpassem o trecho do parque onde
fizemos os desenhos com folhas e sementes no chão, mas que deixassem intacta a
maior das mandalas, porque era a mais bonita. Em pouco tempo, vi que alguns
meninos estavam correndo em cima dela e fiquei muito brava: mas olha o que
vocês fizeram! Acho que vivi para ouvir a resposta deles: “tem problema não, prof...”
E ela concluiu assim “Não adianta tentar prender a felicidade, senão ela
escapa! Pra quê tentar aprisionar o momento, a alegria? Tudo é aprendizado...”
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